Espelho meu, espelho meu… (haverá melhor reflexo do que eu?)
Esta vida é pura magia. Revela-nos sempre as pistas e os sinais que nos ajudam a tornar mais conscientes, mais sencientes. Mais aptos a detetar o que não estávamos a conseguir ver. Para quê?! Para nos permitir (se nos permitirmos) a viver de forma mais fluída, desperta, dentro de uma certa “ordem” invisível que muitas vezes o caos encerra.
Já lá dizia o outro senhor, basta saber “ler” os seus sinais…Quando damos por nós a saber descodificar estes significados dos sinais, a sensação é maravilhosa! E estes sinais podem surgir a partir das mais diversas formas. Seja pelo corpo, pela mente, nos relacionamentos pessoais ou até através dos filhos, da natureza e animais de estimação! Todos nós temos mais um “olho” para além dos que supomos. Um “olho” que nos dá aquela visão interna, que (em dias especiais) nos atira rasgos surpreendentes, servindo como um farol para o caminho e os desafios do momento, e que está muito além do que são os nossos medos, gostos ou anseios. E é aí que a nossa perceção das coisas muda para sempre.
Mas como tudo na vida nada é tão simples assim. Há saltos qualitativos que não se dão da noite para o dia. Requerem o seu tempo. E a sua prática! A sua persistência, perseverança… a sua paciência! Mas quando se dão, nada mais volta a ser como dantes (garantido). Às vezes as respostas estão bem diante dos nossos olhos, simplesmente à espera de serem vistas. E compreendidas. Porém, a pergunta a fazer talvez seja: estamos nós dispostos a aceitar o que nos vem “de fora” como algo que apenas nos espelha e mostra algo sobre “o dentro” de nós mesmos? Porque será que precisamos de um espelho para “enxergar” como está o nosso aspecto antes de sairmos de casa? Porque somente um olhar “de fora” nos mostra como realmente estamos e a forma como aparecemos perante o mundo.
Sem um espelho é impossível fazer um reparo que seja no cabelo desgrenhado, no resquício de alimento nos dentes, ou nos macaquitos que pularam a cerca do nariz. Esta ideia de que o inconsciente de cada um encontra sempre maneira de se manifestar na vida de uma pessoa (por doenças, acidentes, incidentes, circunstâncias e demais importâncias) está longe de ser uma visão “mística” das coisas. A própria ciência cada vez mais o vem sistematicamente corroborando, nomeadamente através de disciplinas como a Física Quântica e a Cosmologia. A própria Psicologia há muito reconhece o conceito psicanalítico de “projeção”, por exemplo, para descrever o facto.
Vamos ao lado prático das coisas! Por exemplo, se eu não reconheço a minha agressividade, e não a aceito em mim, é muito provável que vá “puxar” até mim situações ou pessoas agressivas que tratarei de rejeitar com a mesma intensidade com que recuso a minha. Por outro lado, em paralelo, não deixarei de me encantar com aquelas pessoas que manifestam atributos de combatividade, coragem, ousadia e audácia. Tudo isto, “outras faces” da mesma qualidade fundamental da mesma “agressividade”, enquanto suas expressões “positivas”. Se os outros me criticam, talvez eu me critique, ou critique os outros? Muitos mais exemplos poderíamos descrever, mas talvez tenha dado para ficar com uma ideia. E essa ideia é tão simples quanto isto: a vida é um espelho-reflexo de nós próprios. Uma tela espetacular, na qual todos somos atores (a desempenhar várias personagens) do filme em que estamos a participar.
Os “defeitos” também têm o seu q.b. de luminosidade, porquanto me permitem apreciar todas aquelas qualidades ou “virtudes” que não tendo eu desenvolvido em mim próprio, sei reconhecer nos outros. Beleza, sensibilidade, inteligência, coragem, etc., tudo o que nos apaixona parece de alguma forma fazer parte de e “ecoar” em nós (mesmo que não tenhamos ainda arranjado forma de o Ser ou expressar). Isto significa dizer que existe sempre uma ligação emocional forte com aquilo que rejeitamos. Porquê? Porque não nos cria indiferença. Paixão e ódio são “farinha do mesmo saco”, apenas no seu extremo (positivo ou negativo).
Agora as perguntas. Por exemplo, que relação tem com a autoridade? E qual é a relação que tem com a sua autoridade pessoal, interna? E os seus sintomas físicos? Até que ponto não são mera expressão de dinâmicas emocionais, conforme estuda a Psicossomática? Pois é, voltamos ao princípio. Para dizer que, de facto, a Vida é um enorme espelho. Basta estarmos dispostos a olhar para ela como tal, tendo a humildade suficiente para, quando necessário, nos pormos em causa e aprender com ela.
Perante qualquer situação que lhe aconteça – especialmente aquelas onde se vê a reagir emocionalmente – pergunte-se a si próprio: o que é que “isto” pode estar a espelhar de mim? Vemo-nos por cá.
Fonte: Sara Ferreira – Psicóloga e psicoterapeuta
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