Dieta cetogénica, uma espécie de dieta terapêutica que devia conhecer
A Dieta cetogénica é popular sobretudo junto de desportistas profissionais e praticantes de musculação como forma de “secar” as gorduras. Mas a dieta cetogénica tem uma versão, mais rígida, embora pouco conhecida, que atua como se de um verdadeiro medicamento se tratasse: ajuda a controlar as crises de epilepsia em crianças.
Não há uma mas várias dietas conhecidas por este nome. A dieta cetogénica foi popularizada pelo cardiologista americano Robert Atkins nos anos 70. Na verdade, a “versão” deste médico é chamada mesmo de dieta Atkins ou dieta da proteína e o cardiologista defendeu-a por considerar que o que causa a obesidade não é o consumo de muita gordura, e sim o consumo exagerado dos hidratos de carbono. Em traços largos é um regime alimentar que passa por reduzir ou eliminar tudo o que são massas, arroz e pão branco, mas na qual se podem consumir sem restrições todos os alimentos sem hidratos de carbono, ou seja, todas as proteínas, gorduras e fibras.
Este tipo de dieta – rica em gorduras e proteínas e pobre em hidratos de carbono – é muito popular entre os praticantes de musculação, culturismo e desportistas que não querem perder peso, mas sim perder gordura, mantendo a massa magra (o músculo).
A dietista Andreia Rua explica-nos que quando aplicada aos desportistas, por vezes fala-se de uma dieta cetogénica cíclica. “Se esta população aplicar a dieta cetogénica, tal qual como se define, o desportista pode ficar sem resistência para a prática de atividade física e, para perder gordura sem ficar flácido, esta prática é fundamental. Assim, cria-se um ciclo de hidratos de carbono de modo a preencher as reservas de glicogénio: durante 5 dias a dieta é constituída por muita proteína, gordura e fibra enquanto nos restantes 2 dias privilegiam-se os hidratos de carbono.”
Mas o grande trunfo desta dieta pode mesmo ser para aqueles – sobretudo crianças –que sofrem de epilepsia refratária, ou seja, uma forma da doença que, embora pouco frequente (cerca de 7 por cento dos casos), não cede à medicação, ainda que conjugando vários anti-epiléticos. Conceição Robalo, neuropediatra e responsável pela consulta de epilepsia do Hospital Pediátrico de Coimbra, à margem de um encontro de profissionais de saúde, definiu-a mesmo como uma dieta que é “uma esperança para todas as crianças e familiares de crianças com epilepsia fármaco-resistente”.
Tanto no caso dos desportistas como dos doentes com epilepsia, esta dieta produz o mesmo efeito: induz a cetose. “Este é um estado no qual o corpo converte gordura em corpos cetónicos de modo a que o cérebro os possa usar como combustível quando a glicose está presente apenas em quantidades mínimas”, explica a dietista Andreia Rua.
Mas, nas crianças, como terapia anti-convulsões, o processo é bastante diferente e bem mais complexo: “antes da aplicação da dieta, a criança é submetida a um jejum hospitalar, que dura entre 24 a 72 horas, até se estabelecer o estado de cetose. Atingido este estado calcula-se a dieta tendo em conta que 75 por cento das calorias
totais ingeridas devem ser provenientes das gorduras. A proteína é calculada de modo a que forneça a ingestão apropriada para o crescimento e, os hidratos de carbono preenchem o valor em falta, sendo por isso uma quantidade muito reduzida”, explica a nutricionista.
Tudo isto é pensado ao mínimo pormenor com base na altura, idade e peso ideal da criança, mas a conta que não pode falhar é a seguinte: por cada 6 calorias que a criança consome, 4 devem ser provenientes das gorduras e 2 de proteínas e hidratos de carbono. “As porções devem ser cuidadosamente pesadas, até à ínfima grama. Por vezes, até os hidratos de carbono presentes na pasta de dentes infantil devem ser contabilizados. A adoção desta dieta exige todo um ensinamento aos pais sobre nutrição, desde definições de Kcal [calorias], gordura e proteína a práticas alimentares como peso e medida de todos os ingredientes”, remata a dietista Andreia Rua.
Embora não seja fácil de preparar para os pais e seja um pouco penoso de levar a cabo para as crianças, a verdade é que, de acordo com os estudos mais recentes, a dieta cetogénica permite que um em cada quatro doentes fique totalmente livre de crises epiléticas.
Dieta cetogénica terapêutica, alguns dados:
– O jejum é o primeiro passo para o início da dieta cetogénica.
– A dieta cetogénica é sempre é planeada individualmente. Não forneça sua dieta a outros pacientes.
– O tratamento geralmente é feito por 2 ou 3 anos.
– No primeiro mês a dieta requer um ajuste. Mantenha sempre as anotações da cetonúria e variações do peso.
– O jejum provoca uma mudança no corpo trocando a forma de energia que o nosso organismo usa em condições normais, ou seja, troca a utilização da glicose para a utilização das gorduras. Esta queima das gorduras produz os corpos cetónicos.
– Cetose significa que as cetonas aumentaram no sangue e urina. Quanto mais profunda a cetose, melhor o controle de crises. A dieta cetogénica mantém esse processo e é desta forma que pode ocorrer o controlo das crises epiléticas.
Fontes:
Associação Brasileira de Epilepsia
Andreia Rua, dietista
Associação Portuguesa dos Dietistas
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