Cigarros electrónicos podem conduzir a uma nova geração de fumadores
Carlos Robalo Cordeiro, presidente da Sociedade Portuguesa de Pneumologia (SPP) afirma ao DESAFIO SAÚDE que os cigarros electrónicos representam um incentivo ao consumo e um retrocesso na batalha contra o tabagismo. Saiba porquê.
Porque é que a SPP defende que o cigarro electrónico é um retrocesso na luta contra o tabagismo?
Porque se assiste de novo ao comportamento e gesto tabágico em locais onde a legislação impedia a utilização do tabaco.
Acreditamos também que alguns jovens não fumadores podem começar a usar cigarros electrónicos por acreditarem ser menos nocivo do que fumar cigarros. Existem, aliás, dados internacionais, que revelam que de 2011 a 2013, o consumo de cigarros electrónicos triplicou nas camadas mais jovens. Esta é uma questão que não podemos negligenciar. Não se trata apenas de olharmos para o cigarro electrónico como um incentivo ao consumo e dependência da nicotina, mas também como um retrocesso na longa batalha que ao longo dos anos temos vindo a travar contra o tabagismo. É urgente que esta questão do cigarro electrónico seja regulamentada para que, dentro de 20 anos, não tenhamos uma nova geração de fumadores, conquistados através dos cerca de 7000 sabores existentes no mercado e das atractivas campanhas publicitárias, como as que em tempos conferiram glamour ao cigarro.
O que faz do cigarro electrónico “um tema” tão polémico, na sua opinião?
Tudo o que se desconhece acaba por ser polémico. A SPP, enquanto sociedade científica, não pode aceitar nem recomendar algo como o cigarro electrónico, enquanto não existirem estudos fiáveis que demonstrem, ou não, a sua eficácia.
Para quem não sabe o que é e em que consiste, como define o cigarro electrónico?
Os cigarros electrónicos são dispositivos electrónicos accionados por uma bateria, que dispensam nicotina e muitos outros elementos e sabores sob a forma de vapor aquecido.
Quais os riscos para a saúde pública o recurso ao cigarro electrónico?
De facto não existem estudos suficientes que nos permitam afirmar qual a real dimensão dos danos na saúde. No entanto, existem já alguns estudos que apontam para situações de irritação ocular e respiratória em indivíduos expostos ao vapor, aumento do risco de crises de asma e até desenvolvimento de pneumonia lipóide.
O que defende a lei relativamente a este tema?
O cigarro electrónico foi algo que surgiu num vazio de legislação. Até agora, não há regulamentação para o consumo e venda destes produtos. A Comissão Europeia fez, em Março deste ano, recomendações de legislação dos cigarros electrónicos. Os Estados-membros devem legislar o assunto até ao primeiro semestre de 2016.
A União Europeia recomenda que fabricantes e importadores sejam obrigados a fornecer às autoridades a lista de todos os componentes dos líquidos e dispositivos, e que os cigarros electrónicos com menos de 20mg de nicotina sejam regulados como produtos de tabaco normais, com venda proibida a menores de 18 anos.
Quais as soluções de substituição do tabaco e do cigarro electrónico para que os fumadores deixem de fumar?
Toda a terapêutica de cessação tabágica que apresente estudos clínicos prolongados e credíveis sobre a sua toxicidade e eficácia pode constituir uma opção, como é o caso dos substitutos da nicotina e da medicação farmacológica conhecida e recomendada. Os cigarros electrónicos não estão regulados nem podem ser recomendados como método de desabituação tabágica.
Qual o balanço que faz do Congresso da SPP e da escolha do tema: “Congresso não fumador, incluindo equipamentos electrónicos”?
Toda a comunidade clínica se deve empenhar neste enorme problema de saúde pública que consiste no consumo tabágico e nas suas consequências. Assim, todas as reuniões científicas deveriam ser consideradas eventos livres de tabaco, como, por maioria de razão, aconteceu no XXX Congresso de Pneumologia, que decorreu, também neste aspecto, com grande dignidade, tendo inclusive sido iniciado, nesta reunião, o primeiro curso da Escola de Pneumologia em e-learning, precisamente subordinado ao tema “Travar o Tabagismo”.
Que mensagem daria aos ainda fumadores e em particular às faixas etárias mais jovens adeptas desta substituição do tabaco vulgar?
Não existirá ninguém que fume e que não conheça os riscos que induz na sua saúde. O fundamental é apoiar, de múltiplas formas, essa necessidade urgente de parar a tempo e o Estado não está aqui isento de responsabilidade, pois comparticipando a medicação de apoio à desabituação tabágica também contribuirá para o seu sucesso.
Existem tantos outros motivos de atracção para os jovens que até me parece ridículo recomendar o óbvio: a vossa vida é para ser vivida, não para ser destruída!
A única substância que é natural, segura e saudável para ser inalada é o oxigénio, de preferência o mais puro possível.
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