Suicídio na Adolescência: Números e conceitos
Todos os anos morre um milhão de pessoas de suicídio. Uma taxa de mortalidade global que representa uma morte a cada 40 segundos e uma tentativa de suicídio a cada 3 segundos. Além disso, os comportamentos suicidas são mais extensos e numerosos, ido muito além dos actos consumados e das tentativas.
O suicídio é considerado a nível global como um problema de saúde pública, tanto nos países industrializados como nos em vias de desenvolvimento. Sendo permanentemente objeto de investigação, do ponto de vista macrossociológico. Vários estudos defendem que a tendência de aumento das taxas na maior parte dos países se deve à perda da coesão social, ao desaparecimento das estruturas familiares, ao aumento da instabilidade económica e aumento do desemprego e ao também aumento da prevalência da desordens do foro depressivo.
De acordo com a Organização Mundial de Saúde(OMS) embora as taxas de suicídio globais tenham vindo a baixar, entre os jovens regista-se uma tendência inversa, com um aumento progressivo de ano para ano. Atualmente, pelo menos 100,000 adolescentes cometem suicídio todos os anos, de acordo com a American Foundation for Suicide Prevention e estima-se que o número de tentativas de suicídio seja 20 vezes superior ao número de suicídios.
As diferenças entre géneros são muito acentuadas. A Child Studies Center, reportando a números de 2015, conclui que nos EUA, nas idades entre os 10 e os 14 anos os rapazes comentem suicídio com três vezes mais frequência do que as raparigas, entre os 15 e os 19 anos o número passa para cinco vezes mais e, finalmente, entre os 20 e os 24, disparara para 10 vezes mais. Estas diferenças são explicadas, em parte pelo facto de os rapazes utilizarem métodos de se magoarem mais letais. As exceções a estes valores são a China, Cuba, o Equador, El Salvador e o Sri Lanka onde as taxas entre as mulheres são mais elevadas.
Em Portugal, embora de acordo com o Núcleo de Estudos do Suicídio (NES) a taxa de suicídios tenha vindo a baixar desde 1991, existem assimetrias regionais muito significativas com o sul a apresentar taxas globais 3 a 5 vezes superiores às do norte do país. E, embora as taxas globais tenham descido, as taxas entre adolescentes aumentaram. Segundo os últimos dados do Instituto Nacional de Estatística (INE), 16 jovens, menores de idade, suicidaram-se em 2009, uma subida para mais do dobro comparativamente com anos anterior. Em Portugal o suicídio é a segunda causa de morte dos adolescentes, a seguir aos acidentes de viação.
Comportamentos auto-lesivos: distinguir alguns conceitos
A Organização Mundial de Saúde (OMS) define suicídio como o ato deliberado de alguém se matar a si próprio. Até ao século XIX o suicídio era visto como um ato puramente individual, mas a publicação de estudo pelo sociólogo Émile Durkheim sobre este assunto veio dar-lhe um novo enquadramento passando-se a considerar determinantes as relações entre o indivíduo e o respetivo meio social. Hoje, o suicídio é um problema encarado como um fenómeno complexo no qual estão envolvidos fatores psicológicos, sociais, biológicos culturais e ambientais.
Mas os comportamentos suicidas vão muito além do acto consumado. É o caso do para-suicídio. De acordo com a OMS este é um ato de consequências não fatais no qual o indivíduo tem intencionalmente um comportamento que lhe causará dano, se não houver intervenção de outrem, ou deliberadamente ingere uma substância em excesso face à habitual prescrição ou uso terapêutico reconhecido. De acordo com a Sociedade Portuguesa de Suicidologia, são sobretudo as mulheres jovens que adotam este tipo de comportamento, que por norma está associado a perturbações emocionais.
Estamos perante ações que têm a peculiaridade de o indivíduo deixar pistas ou tomar precauções para que o ato não resulte na própria morte, como seja tomar os medicamentos em excesso numa altura em que conta com a chegada de um familiar a tempo de o poder transportar ao hospital. Mas a verdade é que muitas vezes a ajuda que se esperava que chegasse não chega, e aquilo que era para ser um grito de desespero, acaba por se transformar mesmo num suicídio.
Diferente disto é a tentativa de suicídio: neste caso, apesar de o objetivo visar a sua própria morte, por alguma razão o plano não corre como previsto e o objetivo do indivíduo não é alcançado.
Como explica Diogo Frasquilho Guerreiro, psiquiatra e vice-presidente do Núcleo de Estudos do Suicídio (NES), estamos em todas estas situações perante comportamentos auto-lesivos, ou seja, situações nas quais não havendo um resultado fatal, “o indivíduo se magoa ou faz lesões a si próprio, deliberadamente, por exemplo através de sobredosagens, cortando-se, queimando-se, batendo-se ou ingerindo substâncias não comestíveis) que podem ser feitas com várias intenções”, explica.
Quando a intenção é a morte fala-se de tentativa de suicídio, mas nem sempre é esse o caso: os comportamentos de jovens que se cortam no corpo deliberadamente não estão por norma relacionados com uma intenção de morrer, estando antes associados a situações de fúria ou ansiedade nas quais o indivíduo se magoa de forma a apaziguar o sofrimento que sente.
Como nos conta Diogo Guerreiro, o estudo “Comportamentos auto-lesivos em adolescentes de Lisboa” da Faculdade de Medicina da Universidade de Lisboa revelou que cerca de 7% dos adolescentes (entre o 8º e o 12º ano) apresentaram pelo menos um comportamento auto-lesivo e cerca de metade o faz repetidamente. No entanto, destes 7%, só 2 em cada 5 referem ter tido períodos em que queriam decididamente morrer quando realizavam estes comportamentos. No entanto, é preciso não esquecer que, mesmo sem intenção de morrer, os comportamentos auto-lesivos podem levar à morte ‘acidental’.
Por fim, a OMS refere ainda a própria ideação suicida, ou seja,todos os pensamentos, desejos, atitudes ou planos que o indivíduo tenha para se matar, ainda que em termos concretos e palpáveis nada tenha feito ainda. De acordo com vários autores, este comportamento aumenta com a idade cronológica, principalmente depois da puberdade.
É uma situação que deve ser valorizada por pais e profissionais de saúde e à qual devem estar especialmente atentos quando se aproxima a adolescência.
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